segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Suicídio na Castro e Silva

Encontrei este texto ao acaso, mexendo no meu computador. Devo tê-lo escrito há mais de dois anos, e foi numa época em que estagiava no Comunicação e Cultura, que fica na Castro e Silva, no Centro. Acontece que os prédios dessa rua são bastante antigos e conta-se que as pessoas costumavam subir até lá para se matarem. E eu sempre tive um encantamento meio estranho com isso, ficava observando o prédio e imaginando tudo, dava uma tristeza misturada com fascínio. Sei lá, bem esquisito e bastante canceriano. Já nem me lembrava mais deste texto e fiquei até um pouco surpresa com o quanto é sombrio. E só para esclarecer, não pretendo me matar, até porque tenho uma monografia para fazer e muitos planos para realizar. 

As paredes cinzentas, as janelas quebradas... A escuridão e o silêncio... Tudo isso inspirou de uma forma tão trágica e romântica a decisão de muitos de acabar com a própria vida. Imagino que tenham percorrido todo o caminho do Centro, passaram pela Praça do Ferreira, pelas pessoas apressadas, o relógio que parece mais apressado a cada dia. Solidão de quem passa por muitos e não é visto ou ouvido.

Talvez tenham vindo do Mucuripe, olhado o mar pela última vez na praça do Passeio Público. Sentido a brisa, ouvindo o convite das prostitutas... Quantos não devem ter parado e observado o mar enquanto choraram suas lágrimas de melancolia, tristeza, solidão... Para depois subirem até a Castro e Silva – por qual rua terão ido? Floriano Peixoto ou Major Facundo?

Talvez tenham passado antes e entrado na Catedral da Sé. Rezaram em busca de conforto ou mesmo avisado a Deus que estavam chegando. Que guardasse para eles um lugar mais confortável e acolhedor que aquele mundo onde não encontraram paz. Ou talvez tenham ido com raiva e desespero. Cobraram de Deus a felicidade que não tiveram... Ou mesmo alguns desistiram do fim depois de algumas horas de dúvida e reza – será? Ou o momento da confissão, de pedir perdão pelo grave pecado que estava prestes a cometer...

Dos que não desistiram imagino como foi a escolha do túmulo no asfalto. Em qual prédio entrar, qual andar, qual janela? Terão aberto os braços? Fechado os olhos? De costas ou de frente para o destino escolhido? Terão gritado antes de medo, arrependimento? Em frente ao Edifício Oriente e ao Cartório Cysne, talvez tenham pensado... “O Oriente deve ser um lugar tão bonito... Quero ser um Cisne e voar até o Oriente!” E talvez tenham aberto os braços e voado como cisnes até a incerteza assustadora mais aparentemente tão aconchegante... O consolo de quem não encontra o rumo...

E quando caíram? Todas aquelas pessoas apressadas interrompendo sua rotina diante do horror e do espetáculo sangrento. Observando os miolos espalhados pelo chão, gritando ou sentindo pena. Ou terão visto e gritado antes? Será que acompanharam com os olhos a queda? Será que viraram o rosto no momento do baque? Talvez alguns tenham gritado: “Pula! Pula!” – pedindo por um momento de emoção ao vivo. E tendo o pedido atendido, terão chorado de arrependimento e remorso? Ou terão observado e se deliciado com tal sadismo que os olhos tornaram-se cerrados de tamanho prazer? Se fosse hoje, talvez alguém filmasse tudo para pôr no You Tube ou espalhado por e-mails. E estando o episódio já em rede mundial, uma vida cheia de sentimentos intempestivos, pessoas, lugares, lembranças e emoções, se resumiria a um breve entretenimento de alguns milhões de seres que querendo interromper o ciclo medíocre de suas próprias correrias cotidianas, se deleitariam com o breve vôo (ou terá sido queda?) de um cisne triste, esmagado e sangrento.

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