quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Tem dias que eu fico pensando na vida...

Dia desses estávamos vendo TV, quando pedi para o Potô falar mais baixo porque estava passando Viver a Vida e alguma coisa babado estava acontecendo. Aí o benhê olhou pra mim e disse: Tu mete o pau no cara mas curte, né?

O cara em quem eu meto o pau, a quem Potô se referia é o Manoel Carlos. Ou Maneco, que é
como os mais íntimos ou atores e outros profissionais que tiveram a chance de fazer várias novelas com ele o chamam. E porque eu desço o pau nele? Porque acho suas novelas absolutamente cretinas, machistas e preconceituosas. Os diálogos em sua maioria são bizarros e suas polêmicas fraquinhas. Se ele cria uma historinha para dar lição de moral na sociedade, no restante da novela tudo se contradiz e a tal lição vai por água abaixo. Todo mundo nas novelas é rico, até quem é pobre (só eu tenho essa impressão?) e os
pobres vivem em função dos ricos. Na verdade, isso ocorre em todas as novelas da Globo, né? Os empregados não têm vida própria. Vivem para observar e dar palpite na vida dos patrões. Acho que só vejo empregado de novela ter vida própria em Malhação, porque os filhos dos empregados ganham bolsas de estudo no colégio onde a história se passa e acabam se tornando
personagens ativos na trama, não apenas figurantes ou aquele que
só aparece para atender ao telefone. “Olha seu fulano, é a dona fulana no telefone, que que eu digo pra ela?”

E da mesma forma que até quem é pobre é rico, até quem vive uma barra na vida parece viver melhor que a gente! A Luciana, feita pela linda Aline Moraes, não tem os movimentos do pescoço para baixo (parece que agora começa a recuperá-los) e vive na praia. A família dela (principalmente a mãe, já que a maioria das mulheres ricas da novela são sustentadas pelos maridos) tem todo o tempo do mundo para passear com ela pelas ruas elitistas do Leblon, fazer
ensaios fotográficos, compras, etc. Não tô dizendo que o certo seria deixar a menina mofando no quarto, claro que não. Mas não é surreal que ninguém na casa trabalhe, e ainda assim possa usufruir de tanto luxo? Porque gente comum, pelo que eu saiba, se sofre uma barra dessas tem que se desdobrar com o tempo para pagar tratamento, conseguir transporte apropriado para
deficientes físicos e um monte de outras dificuldades. Ou será que a pensão que o novo personagem machista e asqueroso do José Mayer paga é tão milionária assim? Dá para sustentar
ele, a “primeira Helena negra”, lua de mel de três meses em Paris, a casa enorme onde
eles moram, mais os luxos e o tratamento da Aline Moraes, suas duas irmãs ricas e a ex-esposa e modelo? E ele ainda quer que a primeira Helena negra pare de trabalhar, viu? Vai ser o provedor, oficialmente! Outra coisa, se a Taís Araújo é a primeira Helena negra, porque diabos o Roberto Carlos fica cantando que a “mulher que eu amo tem a pele morena”? Pô gente, demora taaanto para por uma personagem principal preta e ainda erra na trilha sonora e na definição de sua cor? Mas talvez seja melhor que dizer que ela é da cor do pecado, né? Algo me diz que a Taís Araújo tem vontade de dizer uns bons palavrões com certas pessoas nessas horas.

E quanto aos diálogos bizarros? Não sei se alguém já notou, mas no meio da conversa entre os personagens, parece que baixa o Manuel Carlos e alguém faz um looongo discurso sobre as memórias da infância, coisas que os pais ou avós diziam e também sobre como homens e mulheres são. Quando estou assistindo parece que já vem um negócio e eu sinto que senta que lá vem o Manuel Carlos! A da semana passada foi quando um pai brigava com o filho mau humorado gêmeo e engenheiro (ou arquiteto, não lembro) e a mãe dele assistia desesperada à cena. Aí quando o pai levanta a mão para meter o bofete na cara do rapaz, a mãe dele grita: Não agrida seu filho!!! E enquanto pai e filho baixam os olhos sofridos e envergonhados, ela discursa aos prantos que quando era criança uma vez o pai dela bateu em um de seus irmãos e a relação entre eles nunca mais foi a mesma. “Porque a mãe pode bater em um filho, mas um pai não, pois
as coisas nunca mais poderão voltar ao normal”. E aí ela chorou, chorou, veio a bossa nova e os comerciais. E eu lá, boquiaberta com a doidice.

E quem foi que disse que o Manuel Carlos entende a alma feminina pelamordedeus? Não precisa comentar muito sobre essa estupidez, né? Acho que quem fica repetindo que ele conhece nossa “essência” com certeza não é mulher ou está sendo pago para dizer isso.

Ta bem, mas se eu detesto tanto, porque faço “shhhh” pro povo se eu estiver assistindo? Estive pensando sobre isso e acho que encontrei algumas razões:

As novelas dele são incrivelmente bonitas, leves e fantasiosas. Um pouquinho de diálogo, romance e drama, música boa e paisagens lindas. Além da aparência super confortável que todos levam. Passeando e rindo no calçadão, entrando no mar, viajando, tomando drinques na piscina... Tudo parece tão bom que dá até vontade de viver a vida dos outros. Quer dizer, exceto as das empregadas que são assediadas sexualmente pelos patrões e ainda são pintadas de gostosas fatais sem-vergonha e depois morrem no final.

Não precisa assistir tudo para entender o que está acontecendo. A trama acontece num ritmo estático e previsível. Não é como nas novelas das sete, cheias de núcleos e personagens que armam mil coisas, trocam de núcleos, traem e casam várias vezes. Tenho dificuldade e baixo Q.I. para entender esse tipo de trama. Igual com filme de assalto milionário ou de esquemas políticos. São aqueles que chamo “filmes cheios de nomes”. Tipo “Onze homens e um segredo”. Com o Maneco não. Você sabe que existe uma mentira que será revelada mais cedo ou mais tarde e só. Alguém vai levar um tapa durante um confronto muito esperado. E só. Fora isso é paisagem e bossa nova. Posso passar semanas inteiras sem ver a novela que sei que não vou perder o fio da meada. Ou seja: é entretenimento e alienação sem compromisso!

Viver a Vida tem atores que gosto. Gosto da Aline Moraes, Bárbara Paz (desde o tempo da Casa dos Artistas rs!), Taís Araújo e Lilia Cabral. Esse rapaz que está interpretando gêmeos é simplesmente genial! Parecem até dois atores diferentes! Impressionante.

A novela fala bem pouquinho de fotografia e moda. As
personagens principais (Helena e Luciana, creio eu) são modelos e como sinto atração por moda, me sinto atraída pelo universo supérfluo e também pelos estilos das duas. Também tem uns personagens fotógrafos cheios de tempo e equipamento caro para tirar fotos até abusar. E eu sonhando capitalisticamente com minha câmera e um emprego onde eu trabalho quando e onde quiser, cheia de dinheiro, roupas lindas, conversas idiotas, Chico Buarque... Mas o galã cafajeste e a violência contra a mulher eu dispenso, tá?

Um comentário:

Potô disse...

o fato que fazem vc gostar das novelas do autor é basicamente o que fazem a maioria das pessoas gostarem de novelas. O fato dela ser bonita, ser fantasiosa, ter diálogos fáceis, mostrar que uma pessoa pobre também vive bem. São essas coisas que mantêm a alienação nas pessoas. As novelas devem ser bonitas para chamarem a atenção das pessoas, já imaginando que seu público vive em dificuldades, com problemas, e buscam na TV uma vida que ela possa acompanhar.